Algumas das desqualificações das ações realizadas por jovens, como por exemplo a que podemos ler na coluna de Hélio Schwartsman do dia 09/11/2011 da Folha de S. Paulo, chegam a ultrapassar o limite da discordância política, salutar em uma democracia, e, através de argumentos pseudo-científicos caracterizar o jovem como inconsequente por definição biológica. De acordo com o autor, a neurociência explicaria a conduta desviante do jovem com base no que se convencionou chamar “assincronia do desenvolvimento cerebral”.
Tudo se passa, nesse caso, como se o jovem que tem atitudes contestadoras, não tivesse ainda completado o desenvolvimento do córtex pré-frontal, o que somente aconteceria lá pelos 25 anos de idade. Trocando em miúdos, o jovem é inconsequente porque não está formado biologicamente para tomar decisões e raciocinar, profundamente, sobre seus atos.
Não é de hoje que os argumentos que tentam desqualificar os jovens como interlocutores se apegam no quesito da faixa etária. A imagem do jovem ainda sem grandes responsabilidades, sem interesses legítimos em jogo, sem o encargo de uma família própria para cuidar, parece dominar o discurso dos conservadores que taxam como simples irreverência o que pode ser a mais pura e direta discordância política.
Não é preciso muito raciocínio, nem muita idade, para perceber que o argumento biológico aparece na ordem dos discursos contra os “jovens arruaceiros da USP” como forma de inviabilizar o caráter político por trás das demandas estudantis. A biologia e as demais ciências quando aplicadas a interpretar o mundo dos homens não são, e é bom que isso fique claro, neutras. A ciência como resposta para a compreensão das ações humanas pode ser usada de maneira ideológica tal qual qualquer outro panfleto partidário.
O problema é que ela se reveste de verdade incontestável, quando no fundo pode orientar o mais puro preconceito. Dizer, então, que os jovens da USP ainda não sabem direito o que querem é inviabilizar seu discurso como sendo apenas fogo de palha. Pois, como diz o autor, a “juventude é, afinal, um estado passageiro”. O jovem, assim, pode ser plenamente despolitizado pelo pensamento reacionário e seu ponto de vista caracterizado como mera “falta de juízo”.
A tentativa de explicação biológica para uma questão de caráter político-social é uma estratégia antiga para destilar preconceitos e visões de mundo claramente conservadoras. Sob o escudo da ciência, que aparentemente seria imparcial, não foram poucos os que enxergaram no jovem uma maior propensão para o crime, uma tendência para a revolta, uma impulsividade agressiva, ou seja, uma certa conduta refratária às instituições e crenças dos círculos bem-pensantes. Estes últimos, inequivocamente, compostos por homens de família, pagadores de impostos e responsáveis politicamente.
Não me parece, no entanto, que a indignação, a propensão para o crime ou o discurso leviano sejam atributos exclusivos dos jovens, ou que, pelo menos, tenham maior incidência nesta faixa etária. Tem muita gente que passou dos 25 anos e continua não entendendo nada de política, comete crimes e escreve coisas altamente questionáveis.
A idade não é um bom termômetro para avaliar a capacidade de indignação do cidadão politizado, pois, com a mesma frequência que vemos jovens contestadores, também vemos adultos combativos para quem a chama da justiça ainda não se apagou. Acredito, sinceramente, que a atitude crítica não tem idade, nem geração.