domingo, 29 de janeiro de 2017

Diagnóstico Preciso, um conto de Rodrigo Suzuki Cintra


         Cheguei, como de costume, atrasado para a sessão. Claro que eu não gostava nem um pouco de ir lá todas as semanas. Mas, meu comportamento, pelo que diziam, exigia intervenções maiores.
          Ele estava me esperando. Nunca perguntava o motivo de meus atrasos. A verdade é que eu me atrasava só para ver se ele ia falar alguma coisa. Nas nossas conversas, invariavelmente, somente eu falo. Não é bem, então, o que se poderia chamar de uma conversa. Mas, essa parece ser a técnica da coisa toda. Sabia que aquela seria a última sessão. Eu já não aguentava mais aqueles truques intelectuais baratos e além disso, no fundo, tudo que bastava era só eu não querer mais aparecer por lá. Ninguém me levaria à força, obviamente. Avisei, por respeito, mas sem maiores avisos, que seria nosso último encontro. Ele concordou. Não falou nada. Apenas acenou afirmativamente com a cabeça. Eu estava me lixando para tudo aquilo, então, já de saída na porta, antes de dar a despedida final, resolvi fazer alguma pergunta cínica – daquelas típicas coisas que adoro fazer. Eu ia fingir, pela última vez, que me interessava por aquelas conversas: ia simular um interesse no meu próprio caso (como se eu, no fundo, não me conhecesse melhor do que ninguém).
          “Doutor, diga-me com franqueza, qual é o seu diagnóstico?
          Ele me olhava fixamente, mas, não parecia querer falar. Decidi, então, pressionar um pouco: “Eu já venho aqui há muito tempo. Acho que o mínimo que o senhor poderia fazer é ser sincero comigo.”
          Então, ele respondeu: “Você é um impostor!”
          Resolvi investigar melhor a afirmação. Era a nossa última consulta, e afinal, aquilo era uma tese um pouco estranha. Disse: “Mas, doutor, por que diz isso?”
      Ele respondeu prontamente dessa vez: “Você anda se fazendo passar por você mesmo!”
          Não respondi. Desci pelo elevador. Saí para o sol. Atravessei a rua fora da faixa de pedestres. Dobrei a primeira esquina à direita. Não pensava em nada. Eu estava indo a pé para algum lugar qualquer. Talvez, para casa. Dobrei à direita. Estava, de fato, até mesmo feliz, afinal, estava me livrando de uma chatice das boas. Pensei, inclusive, em dar uma passada em algum boteco. Talvez eu devesse, inclusive, comemorar. Eu até que gosto de beber sozinho em botecos sujos. Dobrei à direita e fiquei a olhar o sol, os pássaros, até as nuvens me encantavam com seus formatos inesperados. Comecei, também, a olhar fixamente para as pessoas que passavam por mim. Atravessei a rua na faixa de pedestres. Caminhei alguns metros. Subi de elevador. O corredor era longo e estava escuro. 
          Cheguei, como de costume, atrasado para a sessão.

Um comentário:

  1. Mais uma vez passando por aqui para ler algo inspirador e me deparo com isso. Lindo, adorei.

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